Caso 

Fernando e Glória eram donos do 3º e 4º andar do prédio que habitavam. Na fracção situada no rés-do-chão, que era propriedade da sociedade Retalho, estava instalado o supermercado Super, o qual emitia ao longo dos últimos anos ruídos audíveis e que os impedia de dormir e descansar.

Numa garagem, também propriedade da sociedade Retalho, foram instaladas pelo supermercado Super diversas máquinas. Na verdade, as máquinas aí instaladas, causavam ruídos, uns permanentes, outros intermitentes em ciclos de poucos minutos, o que não permitia, a Fernando e Glória, ter um quotidiano normal e o direito ao repouso e bem-estar, nomeadamente o seu sono nocturno.

Face a tais factos, os nossos subscritores instauraram na então Comarca de Fafe, uma ação declarativa pedindo ao supermercado Super uma indemnização por danos morais, na quantia de 5 000,00 euros a cada um dos autores (Fernando e Glória), acrescida dos respectivos juros de mora. Para além da indemnização, pediram ainda ao tribunal para que o supermercado Super não usasse nas descargas que faziam, carros de transporte manual de mercadorias ou carros com rodados de borracha; a condenação de ambas as rés (Retalho e Super); a cessação imediatamente da utilização do rés-do-chão para outro fim que não o de garagem (por violação do titulo constitutivo) e a reposição do pavimento no estado em que se encontrava anteriormente, já que o mesmo tinha sido rebaixado.

As rés contestaram: a ré Retalho disse, em suma, que não tinha qualquer responsabilidade pelo funcionamento do estabelecimento comercial; a ré Super afirmou que as máquinas em questão tinham sido colocadas há mais de 10 anos, o que nunca suscitou qualquer objecção por parte dos condóminos, que não produziam barulho e que o título constitutivo da propriedade horizontal não impedia que fossem colocadas máquinas.

Foi proferida sentença que decidiu a acção parcialmente provada e procedente, condenando a Ré Super a pagar a cada um dos autores a quantia de 1 500,00 euros; a não usar nas descargas carros de transporte manual de mercadorias com rodas de plástico duro ou de outro material ruidoso. As rés Super e Retalho foram ainda condenadas a deixar de utilizar a garagem como instalação de maquinaria de apoio ao supermercado e a repor o pavimento do referido local, no mesmo estado em que se encontrava antes da colocação das máquinas.

Inconformadas com a sentença, as Rés interpuseram recurso da mesma. Alegaram que ficou provado que o ruído medido na habitação dos autores cumpria a legislação em vigor, que foi realizado nas condições mais adversas possíveis, concluindo-se que o ruído proveniente das máquinas não era relevante para os níveis existentes nos quartos da residência dos autores.

No entanto, o Tribunal da Relação não teve qualquer dúvida que os ruídos em causa eram suficientes para dificultar o repouso de Fernando e Glória, o que lhes originava cansaço, julgando-se assim improcedente o recurso. A indemnização foi ainda revista e fixada em 3 000,00 euros, devidos a cada um dos autores, por danos não patrimoniais, mantendo-se, a decisão recorrida.


Comentário

 No que respeita à emissão de ruídos, não importa apenas saber se os mesmos obedecem aos limites máximos consagrados no Regulamento Geral de Ruído, já que também deve ser observada a restante legislação em vigor, nomeadamente, no que concerne aos direitos de personalidade. E o direito ao repouso, ao sono e à tranquilidade constituem uma emanação dos direitos fundamentais de personalidade, estando os mesmos constitucionalmente consagrados.

A violação destes direitos não pode nem deve ser considerado como algo de pouca relevância, já que os mesmos podem por em causa factores físicos e o equilíbrio psicológico de um ser humano.